Feras amáveis e urbanas sorriem
espreitando a oportunidade de caírem implacáveis
sobre a presa. Falam de nariz no ar
como quem fareja o sangue da vítima.
E a mosca zumbe no interior das suas palavras
tantas vezes sem voz, palavras pesadas
da herança de gerações que buscaram
na vertigem da arena a sua cama
e da cama fizeram a arena do ódio pequenino
jogado em jogos nem sequer de azar
porque no corpo a corpo do tédio que engendraram
tudo estava irremediavelmente previsto.
Indiferentes ao sobressalto dos dias,
tendo por cúmplice a pequena mosca familiar
de patas peludas cheias de merda,
por entre anéis de fumo bebem bebidas finas
e observam sem entender o reflexo fugaz
do espelho das imagens lentas e oblíquas.
No último farrapo do tempo, quando chegar a hora
da metamorfose irrevogável, fitando-os,
haverá uns grandes olhos parados
de granito facetado, que sorriem.
Dezembro, 1976
Jorge Campos
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