
apenas o silêncio pode atenuar
este momento:
as avenidas estão desertas
e aves agonizam nos meus braços;
feridas,
o hálito puro rarefeito,
as aves que morrem nos meus braços
têm os olhos líquidos
de como quando o pavor
se faz espanto.
1973
apenas o silêncio pode atenuar
este momento:
as avenidas estão desertas
e aves agonizam nos meus braços;
feridas,
o hálito puro rarefeito,
as aves que morrem nos meus braços
têm os olhos líquidos
de como quando o pavor
se faz espanto.
1973
Atualizado: 8 de fev. de 2021
Como um náufrago procuro os cristais da palavra, os seus lábios húmidos de dizer, as suas longas pernas de ventos e florestas, mas é tarde, e ao dobrar da esquina de uma rua oblíqua de mim mesmo descubro uma fuligem de chuva, um cheiro intenso a óleo queimado que alastra no fluxo nervoso da cidade anunciando a vertigem da solidão. Para tanto bastará o medo soltar a alavanca da noite e deixar-me entregue à minha memória registadora de nomes e atrocidades. Não, não sei nomear a cartografia do rosto ao espelho. O tempo presente passa implacável por entre as ruínas do tempo passado: como habitar este lugar se o estar aqui é apenas refúgio do insondável tempo futuro? Sigo rumo às estações suspensas da respiração da pedra. Vejo cachorros e guardas vindos do fundo da noite para apagar o sopro das estrelas, vejo exércitos no seu ritual sombrio de passada lenta e ouço o espanto das vozes na luz coagulada do silêncio. Tropeça súbito um corpo interdito em clarão, no peito o impacto absurdo de uma flor fulminante. Há uma silhueta em câmara lenta multiplicando, aflitas, as mãos. Numa folha de papel levada pelo vento escrevo um rosto em seu rigor absoluto na fria caligrafia do chão.
fevereiro de 2012 (atualizado)
Atualizado: 11 de nov. de 2023
a tua língua lenta nos lábios húmidos da minha fenda voa súbito até à
agonia da minha boca e vagarosa como a saliva encontra os meus seios
impacientes do despudor das tuas mãos, duros de serem presa dos teus
dentes, ó sentir-me assim prestes abusada no veludo da pele, ceder
ao toque dos teus dedos, sucumbir à tormenta dos teus flancos, ouve,
quero soltar-me no grito obsceno da garganta, quero ser festim do teu
corpo a prumo na gruta que doendo rompe a penumbra do meu ser,
ó, sim, dá-me a claridade dos sentidos como se a luz incandescente
de um cometa rasgasse a brancura dos lençóis e me fizesse fêmea
contigo no galope da cama, exultante do estertor do teu relâmpago,
inteira de saber-me na alma fulgor do teu banquete.
08/10/2012
"O mundo, mais do que a coisa em si, é a imagem que fazemos dele. A imagem é uma máscara. A máscara, construção. Nessa medida, ensinar é também desconstruir. E aprender."